Pedro Jorge de Castro, cineasta de ‘Tigipió’, começa a mobilização em busca dos negativos de vários filmes dele. Há suspeita de que material possa estar na Cinemateca, atingida por incêndio, em 29/7
O cineasta Pedro Jorge, ao lado do montador de ‘Brinquedo Popular do Nordeste’, Manfredo Caldas, em 2007 – (crédito: Paulo de Araújo/ CB DA Press)
Primeiro cineasta de Brasília a conquistar um troféu Candango a permanecer na capital, o cineasta Pedro Jorge de Castro, aos 77 anos, vive a incerteza dos destinos de muitos filmes realizados, depois do incêndio que atingiu galpões da Cinemateca Brasileira (29/7).
“Não tenho bem certeza do que está lá. Isso é um sofrimento. Sei que alguns negativos de filmes estiveram na Cinemateca do MAM (RJ), entre eles O homem que ensinou a voar (em torno da figura de Santos Dumont) e Brinquedo popular do Nordeste (1977). Não sei se alguns negativos foram para a Cinemateca (em SP), quando da desativação da Laboc Cine, há cinco anos, quando 5 mil latas foram para a Cinemateca do MAM, algumas até sem identificação”, conta o diretor.
Títulos que entraram e saíram de instituições, com sorte, podem ter parado no Centro Técnico Audiovisual (Rio de Janeiro). Tigipió, uma questão de amor e honra e O calor da pele (1994) e O sinal da cruz (episódio integrado, em 1989, no longa Brasília, a última utopia). São ficções com atores como B. de Paiva, José Dumont e Regina Dourado. “O sinal da cruz começa com o descobrimento do Brasil e o colonizador faz o risco do Eixo Monumental, enquanto, ao fundo, índios complementam o símbolo, fazendo o arco das duas asas (Sul e Norte). É o surgimento de Brasília no primeiro instante do Brasil”, comenta o realizador.
Dúvidas
Como pessoa responsável pela coletânea de curtas de Brasília, a última utopia, Pedro tem certeza do destino da fita rumo à Cinemateca. Em memória de Dona Maria Primeira, de Pedro Jorge, encerrou o Festival de Brasília (há 37 anos), e, na biografia, o diretor traz homenagem, há quase uma década, no Festival de Brasília, além da criação do Festival de Fortaleza do Cinema Brasileiro (atual Cine Ceará). Na carreira, em Paris, colheu o depoimento com uma comadre de Santos Dummont, no único depoimento dado, que relutou, e nem mesmo para televisões europeias havia falado do célebre amigo, que rendeu até o batizado do filho (Alberto), em sua homenagem.
A suspeita do paradeiro das fitas na Cinemateca ainda recai sobre uma obra em torno da produção agropecuária e minifúndio, filmada desde o Rio Grande do Sul até o Ceará, e que foi exibida em Brasília e Roma. Esse, além de Boca de forno que mostra o desmatamento para feitura de carvão (em Unaí). “É poético, ainda que o tema seja nefasto”, observa Pedro Jorge.
Toda a situação de calamidade na Cinemateca Brasileira reforça a percepção do cineasta: “O Estado é uma ficção política-administrativa; o que existe é a cidade em que pessoas vivem”. Enquanto não descobre o destino dos filmes que fez, Pedro Jorge divaga: “Ficamos com a sombra da amnésia, e o único modo de, ironicamente, revermos os filmes feitos é fechar os olhos e imaginá-los. Quando a gente filma, as imagens ficam registradas na nossa interioridade”.